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Meliante

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                                      Parte 1
“Melhor do que um chefe só o próximo”. A placa de bronze na lápide de Meliante encerrava um ciclo, mas não extinguia uma raça. O elo perdido entre o réptil e o mamífero que Charles Darwin esqueceu de catalogar.

Meliante ganhou o apelido, que mais tarde virou nome registrado em cartório quando a partir dos 11 anos passou a delatar colegas no colégio em troca de notas maiores. Não satisfeito, era coroinha na instituição católica fundamentalista ligada a TFP, Tradição, Família e Propriedade, uma espécie de Ku Klux Klan tropical.

O maior desejo de Meliante era ganhar um troféu de Literatura, banhado em ouro, que repousava na mesa do padre diretor. Mas, admitia para si mesmo, não sabia escrever direito e a única maneira de conquistar aquele troféu seria, mais uma vez, acionar a sua patifaria endêmica.

Meliante era sonso. Não conhecia a palavra, mas a sensação. Seu jogo duplo conciliava a função de gandula do time de futebol dos colegas, tarefa que exercia com mentirosa servidão, com a de delator.

Gostava tanto de detalar que seu primeiro orgasmo aconteceu enquanto contava para o diretor do colégio como havia flagrado um grupo de colegas bebendo o vinho da missa das sete atrás de um barracão de obra. Ele disse “estavam Fulano, Beltrano com um copo de geléia...Si...crano...com uma re...re...re...vista..” e veio a onda de orgasmo que só não foi maior do que a que ocorreu no dia em que conseguiu roubar do quadro de avisos a circular com os nomes dos alunos expulsos graças a sua delação.

Mas, faltava o troféu. Meliante nasceu num bairro de classe média baixa da periferia e aos oito anos viu um vizinho atirar num garrafeiro aos gritos de “toma, seu meliante safado! Toma!”. Foram três tiros na cabeça. Motivo: o garrafeiro discutia uma dívida e teria dito “você pode ter deixado Tramóia das Trevas, mas Tramóia das Trevas não deixou você.” Tramóia das Trevas era uma cidade que, diz a lenda, existiu em Minas Gerais.

Todo mundo correu para acudir o pobre garrafeiro, menos Meliante que voou para o dicionário. Meliante queria saber o que significava meliante. Descobriu, eufórico. Aos 10 anos constatou que era um meliante autêntico. Chantageou um primo forçando-o a chamá-lo de Meliante numa festa. O primo chamou, apanhou muito dos pais por isso, mas o apelido vingou. Vida a fora.

Mas faltava o troféu. “Falta o troféu!”. “Falta o troféu!”. Os gritos de “falta o troféu!” despertaram Meliante no meio da noite. Estava suado. Acendeu a luz, o poster de Hitler continuava na parede. Um poster que ele obrigou, sob tortura, um colega a manipular no photoshop. Meliante aparecia ao lado do ditador, com a mesma roupa, o mesmo gestual, a mesma patologia. Mas faltava o troféu.

No dia seguinte acordou disposto a ganhar aquele troféu. Bem cedo, foi no pequeno canil adaptado perto da garagem do ônibus do colégio. Lá estava o chimpanzé de Padre Ângelo, melhor amigo de Meliante. O símio não confiava nele e todas as vezes que se aproximava da jaula o macaco sacudia a grade e gritava. Chamava-se Anselmo em homenagem ao cabo da Marinha.
Anos antes, Meliante já lera:

“Após o golpe de 64, Anselmo foi expulso da Marinha pelo crime de motim e revolta. Chegou a ser preso, mas fugiu e exilou-se no Uruguai e depois em Cuba, onde teria feito treinamento de guerrilha. Voltou ao Brasil em 1970 e ligou-se como membro atuante no movimento guerrilheiro. Acabou preso pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury, do Dops.

“Logo após da sua prisão, Anselmo aceitou trabalhar para o Governo Militar, infiltrando-se em grupos de esquerda e movimentos sindicalistas. Porém, existem fortes suspeitas de que antes de 1964, Anselmo já era um agente infiltrado nesses movimentos e sua função era fornecer informações para os órgãos de repressão do governo. Esses dados foram confirmados pelo policial Cecil Borer, ex-diretor do Dops do Rio de Janeiro. Cecil afirma que Cabo 
Anselmo já possuía treinamento específico para trabalhos de infiltração antes do golpe militar. Por outro lado, supostos documentos do DEOPS-SP registram Anselmo como agente apenas a partir de 1971, após sua prisão.

“Durante sua atuação como agente, Anselmo levantou com sucesso uma grande quantidade de dados sobre os movimentos dos guerrilheiros brasileiros, resultando na prisão, morte e tortura de vários de seus integrantes. Dentre eles, estava a própria namorada de Anselmo, a bela Soledad Barrett Viedma, que estava grávida de 4 meses . Mesmo assim, Anselmo a entregou para o delegado Sérgio Paranhos Fleury. Soledad não resistiu as torturas e morreu.

“Após sua função de agente infiltrado ser descoberta pelos guerrilheiros, Anselmo desapareceu entre 1972 e 1973, época que foi dado como morto, ou pelas forças de segurança do Governo Militar ou pelos guerrilheiros.

“A dúvida desapareceu a partir do momento em que o Cabo Anselmo foi entrevistado pelo jornalista Octavio Ribeiro, com sua publicação pela Revista Isto É, na edição de 28 de março de 1984.

“ No início dos anos 80, Cabo Anselmo ainda transitava livremente pelo Dops e tinha ligações com o delegado Josecyr Cuoco, com quem mantinha uma agência privada de informações que, com agentes infiltrados no movimento sindical e acesso aos relatórios do Dops, vendia informações para clientes privados e empresas, especialmente do setor automobilístico, na época muito assustadas com o novo sindicalismo que nascia no ABC.

“Hoje, o ex-marinheiro reivindica ainda uma aposentadoria condizente com o posto que ocuparia na Marinha, que seria o de subtenente aposentado. O argumento de Anselmo é que a indenização da Comissão de Anistia não deve beneficiar apenas os militantes de esquerda. Ele alega que todos que foram de alguma forma prejudicados ou cassados em seus postos em razão do golpe militar deveriam ser beneficiados.”

A biografia do cabo era projetada como um filme saudoso nos vasos e artérias de Meliante, mas justiçar era preciso. Naquela madrugada, a banana com mel e chumbinho silenciou o chimpanzé. Para sempre. Mais: Meliante, de luvas, entrou no canil adaptado e degolou o símio com uma foice. Mais: escalpelou levemente o mamífero. Mais: levou pedaços de pele nos bolsos.

Voltou para casa, tomou banho e se tivesse barba teria feito. Vestiu o uniforme e rumou para o colégio. Total comoção. Polícia, legistas, veterinários. Meliante passou cristal japonês nos olhos e se atirou aos pés de Padre Ângelo balbuciando “quanta covardia...quanta covardia”. Sabia que padre Angelo seria o próximo diretor graças a sua íntima relação com o Arcebispo e com militares da reserva e civis que torturaram muitos brasileiros durante a ditadura de Costa e Silva e Médici.

Em vez de revistaspornôs, Meliante usava fotos de Costa e Silva, Médici e do facínora delegado Sergio Fleury para se masturbar. Achava que tinha nascido em época errada. Queria servir aquela ditadura que não existia mais. Por isso, tornara-se cúmplice de um uruguaio que dava aulas de História no colégio e que teria sido um agente da temida Operação Condor, outra paixão de Meliante que ficou 18 horas seguidas lendo sobre o assunto em sites indicados pelo Google. Ah, como ele queria participar daquele espetáculo sul-americano.

O colégio abrigou o uruguaio, codinome “Professor G”. Ele teria ajudado aqueles padres radicais a se livrarem de dois pais de alunos ligados a Dom Helder Câmara, odiado por seu hálito liberal e democrata.

Mas, estamos no enterro do chimpanzé. Todos foram sepultar o símio perto dali, num cemitério de cachorros. Como Meliante previra, padre Ângelo não quis ir. Como Meliante previra, padre Ângelo ficaria em sua clausura...bebendo “Fogo Paulista”. Era alcoólatra, mas só Meliante sabia. E como Meliante previra, não foi difícil seduzi-lo. Tomado pelo álcool, pela morte de Anselmo e provavelmente sem saber o que estava fazendo, Padre Ângelo caiu na cilada e sodomizou Meliante. Em seguida tombou na compacta cama de solteiro, cansado, bêbado. Meliante tinha posicionado sua câmera que gravou tudo.

No final do dia, mais duas previsões se confirmaram: o troféu era seu graças a uma trêmula carta-súplica de Padre Ângelo ao diretor; o mesmo padre Ângelo se enforcou no quarto, sem deixar bilhete. Só Meliante sabia o motivo que pairava muito além do jardim onde sepultaram o chimpanzé.

                                            Parte 2

No dia de seu 25º. aniversário, Meliante foi comemorar com uma família que alugara num classificado de jornal. A esposa (detestava que a chamassem de “sua mulher”) era um transexual de programa que ele mandou o síndico do seu prédio arregimentar nos classificados de jornais. Os dois filhos adolescentes, Meliante tirou ainda bebês de um desafeto, na base do que mais sabia fazer: chantagem.

A falta de talento o incomodava. Muito. Meliante era vaidoso e mantinha em casa, uma cobertura tríplex nos Jardins, São Paulo, uma gigantesca biblioteca. Mas, dos livros, só as capas. Não havia miolo. Para Meliante conteúdo era detalhe. Na faculdade, mediante negociatas com colegas e professores do tipo “você fuma maconha à vontade que eu não conto aos meus amigos delegados desde que...”. E o “desde que” eram provas feitas por terceiros, além de trabalhos, teses, defesas orais. Meliante exigia: “se fizerem serviço porco e eu tirar menos de 9, jogo no calabouço”. Sua vaidade foi aos píncaros quando foi homenageado no final do curso como aluno número um. Palco, luzes, microfones. O habitat natural de Meliante. Sua falsa família, claro, sentada na primeira fila.

Rico? Sim, Meliante estava muito rico. Achacando, dedurando, coagindo e, sobretudo, babando ovos dos poderosos ganhou seu primeiro milhão de reais num mês de julho. Foi comemorar com dois falsos amigos num restaurante quase popular do centro de São Paulo. Lá, brindaram ao milhão.

Além das manobras escusas, Meliante obteve uma espécie de bolsa “cala boca” do colégio onde estudou. Graças a módicos e vitalícios 200 mil reais por mês não enviaria para os jornais o dossiê que montara, ao longo de anos, denunciando todas as falcatruas financeiras, pedofilia e até tráfico de drogas que a cúpula do colégio praticava.

Um dia, singrando a avenida Paulista com seu Mini Cooper zero km, a caminho de casa nos Jardins, Meliante suspirou e pensou “é, estou com o boi na sombra”. E estava. Apesar da falta de talento, se meteu em política. Achou por bem não se filiar a nenhum partido para que suas traições ganhassem mais, digamos, dinâmica. Traindo aqui, ali, usando seus métodos tradicionais acabou se tornando destaque em um grande partido, apesar de não ser filiado.

Ao mesmo tempo vendia informações sigilosas do partido para outros, especialmente quando essas informações revelavam escândalos sexuais, financeiros e afins. Meliante adorava um escândalo. A cúpula do “seu” partido o endeusava. Meliante lambia botas, sapatos, sandálias, estava sempre a disposição para qualquer missão (especialmente as espúrias), era o primeiro a chegar nas reuniões e sempre o último a sair. Seja em São Paulo, Minas, Rio ou Brasília.

Seu pai, comunista histórico, sabia o filho que tinha mas temia romper relações. Meliante fingia sentir saudade, o pai simulava o mesmo. Mas, numa noite de Ano Novo, Meliante, a esposa, os filhos, que decidiram passar juntos o Reveillon, o pai de Meliante se excedeu na bebida e começou a dizer algumas verdades. Meliante, sorriso sonso sempre a postos, cochichou no ouvido do pai: “Tudo, menos verdades, tá bom?”. Dois dias depois, o velho comunista jazia morto na piscina.

Sua mãe? Um dogma para Meliante que só o pai conhecia. Ele foi parido na margem do rio Paraíba do Sul e jogado ali mesmo. Foi encontrado por um grupo de escoteiros que foi ao Juizado que acabou localizando o pai. Da mãe não se tem notícias, até hoje.

O patrimônio de Meliante bateu a cifra de um bilhão de reais quando ele fez 31 anos. Resultado de sua escroque movimentação de informações que envolvia até dois presidentes sul-americanos, que, sonso, tratava de “meus caros amigos”. E tudo ia muito bem. A vida de Meliante ia de vento em popa.

Um dia, ele pegou seu jatinho e decolou sem rumo. Ao piloto disse apenas “vá pro Nordeste, meu querido”. Mandou que descessem numa cidade do interior da Bahia. Meliante, sorriso sonso, mandou a tripulação aguardar. Pegou um táxi. “Meu querido, me leve a um parque de diversões”. O parque, mambembe, pobre, ficava a 10 minutos do pequeno aeroporto. Meliante pagou, “obrigado meu querido” comprou algodão doce e sentou na roda gigante. Quando sua cadeira atingiu o ápice, Meliante se jogou. Morte instantânea.

O médico-legista teve vontade de escrever “morte por overdose de si mesmo”, mas não há respaldo científico para isso. No velório, um mar de falsidades. Todos os amigos-vítimas passaram por lá, mas só acreditaram que Meliante estava realmente morto quando o corpo desceu e a esposa, herdeira trilhardária, fingindo choro, beijou a placa-lápide: 

“Melhor do que um chefe só o próximo” e intimamente sorriu.








Favelas, um frisson para o voyeurismo dos abastados

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    São Conrado, anos 1950.                                                                           
    São Conrado hoje.


Um dia desses recebi um e-mail com fotos antigas da cidade e a primeira coisa que constatei foi a beleza dos nossos morros antes de serem tomados por favelas. Um processo que parece cada vez mais acelerado e desgovernado. Pelo que ouço por aí as favelas simbolizam um processo de degradação urbana que faz mal, principalmente, a quem vive lá. Você conhece alguém que goste de viver numa favela?

Em 1980 tive um programa na Rádio Jornal do Brasil chamado "Vida no Rio". Durante um período fiz uma série especial chamada "vivendo na favela" que me fez visitar várias, especialmente às margens da Avenida Brasil (Maré, Vila do João, etc) e também em Niterói, Zona Sul do Rio, enfim, foi um trabalho duro mas que valeu a pena.

A primeira pergunta que fazia às dezenas de pessoas que entrevistei foi "o senhor/senhora gosta de viver aqui?". Ninguém, absolutamente ninguém, disse que sim. O sonho de todos era uma casa própria num lugar digno, "mesmo que fique mais longe", ressaltavam alguns. E nunca é demais deixar claro que a maioria absoluta dos moradores das favelas é gente do bem. A criminalização de quem mora em favelas é preconceito burguês, velho, imbecil.

O curioso nisso tudo é que as pessoas que cultuam as favelas não moram lá. Em geral são abastados que carregam um discurso pronto em defesa do que a realidade chama de "submoradias" penduradas pelas cidades. Ah, o politicamente correto manda dizer que não é de bom tom usar a expressão favela e sim comunidade. Dane-se o politicamente correto, uma versão new wave de um hipotético “manual de funcionamento da famigerada UDN".

Se ao longo dos anos as favelas fossem dando lugar a moradias dignas, respeitosas, humanas, eu escreveria comunidade com o maior prazer. Mas não estou aqui para fazer o jogo dos contentes. Não vim ao mundo fazer média e sim mídia e, até segunda desordem, favela é favela.

A remoção das favelas para habitações mais dignas é um dos mitos da politicagem nacional. Poucos tocam no assunto. Favela é quintal de política baixa, fundamentalismo religioso, baia de espertalhões, domínio dos traficantes de tudo. Com a cavalgada incontrolada (e estimulada) da explosão populacional (agrada a politiqueiros caçadores de votos) hoje é mais fácil apontar uma cidades que não tenha favelas do que as que têm.

Tempos atrás a TV exibiu uma reportagem especial sobre tráfico de crack e outras drogas e fiquei chocado com a quantidade de favelas em Ouro Preto, cidade-Patrimônio da Humanidade. Como vimos naquela recente tragédia, aqui no Estado do Rio cidades serranas como Teresópolis, Nova Friburgo e Petrópolis também estão tomadas de "comunidades". E quando chega o verão com suas tempestades nosso coração aperta vendo aquele festival de desabamentos cheios de vítimas que, com certeza (bato na tecla) não queriam viver lá.

Há quem diga que é um problema sem solução. Já li vários textos dizendo que a tendência do Brasil é se transformar em um dos maiores favelões do mundo. Sei que os fiscais de muitas prefeituras responsáveis pela não proliferação das favelas se recusam a subir os morros com medo de levar tiros. Por isso as cidades estão cercadas e prevê-se, em breve, o temido estrangulamento urbano, que em outras palavras significa perda total.

O que fazer? Opine aqui.

A emoção do duo Gisbranco no maravilhoso palco do Teatro Municipal de Niterói

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    Marilda Ormy
    Duo Gisbranco em cena
    Bianca Gismonti e Claudia Castelo Branco

Ontem foi uma daquelas noites que não esquecerei, ficou gravada no coração. Fui a apresentação do duo Gisbranco no maravilhoso palco do Teatro Municipal de Niterói.

Acompanhado me minha sobrinha Catherine Beranger de Farias Mello (atriz e futura estudante de Comunicação da UFF) fui ao Teatro a convite da B2 Filmes, do amigo Darcy Bürger que gravou um DVD do concerto comemorativo de 10 anos da dupla de pianistas. Que pianistas! Que sons mágicos Bianca Gismonti e Claudia Castelo Branco conseguem tirar dos dois pianos Steinway & Sons do Teatro.

Antes do show, muita emoção. Afinal, no passado fui presidente da fundação de arte de Niterói (a FAN), responsável pelo TMNIT e mais recentemente diretor de programação do Teatro. Fiquei muito feliz em ver que o nosso Municipal continua impecável, lindo, extremamente bem cuidado.

Mas o que mais me emocionou foi o carinho comigo de todos que lá trabalham. Marilda Ormy, diretora geral, sempre muito querida, profissional que esbanja talento, abriu seu belo sorriso. Ela, a administradora Teresa Veras Salgado (cuida do Teatro como se fosse um filho), a coordenadora de palco Luciene Rocha, as bilheteiras Najara Carlos, Taís Mazzeto e Shaliná Avellar, enfim, todo mundo esbanjando afeto, consideração. Obrigado!

A equipe da B2 Filmes (umas 15 pessoas) como sempre no maior profissionalismo. Eles gravaram a apresentação com 12 câmeras, sob direção de Darcy Bürger, praticamente sem que a plateia de felizardos que foi assistir ao duo Gisbranco percebesse. Trabalho meticuloso de captação de imagens, sons, luz que vão se transformar num belíssimo DVD.

Quanto ao duo Gisbranco é o que existe de mais genial, contemporâneo e espetacular no cenário musical brasileiro. É formado pelas pianistas Bianca Gismonti e Claudia Castelo Branco e interpretam músicas de Moacir Santos, Chico César, Egberto Gismonti (compositor e pai da Bianca), Hermeto Pascoal, Astor Piazzolla (entre outros), além de composições próprias.

Bianca e Claudia estavam visivelmente emocionadas com a data de ontem, comemorando os 10 anos. Um destaque muito especial para o cantor, compositor, multinstrumentista Chico César que fez uma brilhante participação especial.

Enquanto o show avançava (nunca vi dois pianos dialogarem com tanto talento, pureza e técnica), lembrei que quando o Municipal estava em restauração, nós da FAN fizemos uma temporada experimental.

O teatro ainda estava sem o novo ar condicionado e o diretor da restauração, Claudio Valério Teixeira, teve uma ideia: fazer a “Temporada de Obras e ConSertos”, assim mesmo com S para informar que os recitais aconteceriam durante as obras. Foi demais! Ao longo de uma semana, com a plateia superlotada, grandes nomes do instrumental brasileiro passaram pelo palco do Teatro, como Turíbio Santos, Wagner Tiso e Egberto Gismonti.

Egberto chegou às quatro da tarde e, como seu fã, fiz questão de recebe-lo. Ficamos ele, Claudio, eu, a produção, num barracão de obra que hoje é a Sala Carlos Couto batendo papo. Depois de ver a restauração em andamento, Egberto ficou maravilhado e contou que o piano do Teatro (na época só havia um) é um Steinway & Sons série Hamburgo, segundo ele uma safra muito especial.

Antes do recital, o músico saiu sozinho pelo centro de Niterói passeando, olhando as pessoas, o movimento, o cotidiano e a noite fez um dos mais espetaculares concertos que já assistir. Ontem, sua filha, me provocou emoções idênticas.

Como é bom amar a música.




Até pra corruptos sou contra a pena de morte

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A corrupção é um crime tão hediondo quanto a exterminação em massa de inocentes promovidas por seriais killers, privados ou estatais. A roubalheira mata em hospitais falidos, na (jn) segurança pública, enfim, quando o Estado é a atacado neste nível crítico que o Brasil sofre de novo atualmente, só nos resta lutar para que as pessoas de bem reajam e coloquem os meliantes na cadeia. E berrar alto, muito alto para que as forças armadas (que também tem muitos corruptos a bordo) não se juntem aos farsantes e partam para um golpe de estado.

Você vai dizer que “a esta altura é impensável um golpe no Brasil”. Pois saiba que em 1963 pensava-se assim, “golpe nem a pau” e veio 1964 e, pior, baixou o 13 de dezembro de 1968, quando costa e silva (assim mesmo, em minúsculas) assinou o AI-5 e o Brasil caiu nas trevas.

O momento não é de contemplação, mas de atenção, muita atenção. Quanto a pena de morte para corruptos, proposta por alguns leitores desta Coluna, sou terminantemente contra. Parte do judiciário também nada em corrupção e ia mandar matar muita gente em troca de grana. Há ainda o aspecto humanitário, que condena a pena capital.

Penso que a prisão perpétua, tanto para colarinhos brancos e traficantes (são todos iguais nessa noite suja), cabe como luva.


Ou não?

Ex-vereador Carlos Magaldi, assassinado pela indolência administrativa que transforma Niterói numa pocilga

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No início da tarde de ontem, o ex-vereador Carlos Magaldi (67 anos) foi assassinado no bairro de Camboinhas, Niterói. Dois bandidos a pé renderam Magaldi que, assustado, acelerou o carro e levou um tiro a queima roupa no pescoço. Morreu praticamente na hora.

Como tantos cidadãos de bem do Estado do Rio e da cidade de Niterói, onde a polícia está sucateada há anos, Magaldi foi vítima da indecência, da imoralidade, da falta de respeito das autoridades afogadas nessa politicalha suja de fazer marketing com vidas alheias. Todo mundo sabe que a cada UPP inaugurada no Rio, dezenas de bandidos migram para Niterói onde fazem o que querem, o que bem entendem e implantam a barbárie.

Toda a cidade está dominada pelos bandos que há anos partem da periferia do Rio, do Complexo do Alemão, da Maré, da Rocinha e tomaram morros como Preventório, Souza Soares, Estado, favela do Sabão. Aproveitando-se de um governo do Estado indolente e covarde a bandidagem tomou Niterói.

Ontem à tarde, apressado para um compromisso, fui “abordado” por um moleque de uns 20 anos que se auto intitula “morador de rua, vindo da Baixada” (ele me disse isso), tentou me achacar. Ele e sua quadrilha moram há mais de um mês numa calçada na esquina de ruas Pereira da Silva e Tavares de Macedo, em Icaraí, um dos mais caros IPTUs do país. O escroto me olhava como se a culpa de seu suporto flagelo fosse dos habitantes dessa cidade que está prestes a se transformar numa pocilga. Falei que não ia dar dinheiro nenhum. Ele atravessou a rua e tentou achacar uma senhora de idade. Fui atrás, acabei gritando com ele, ameaçando de porrada e com certeza ganhei um inimigo. Dane-se! A coisa chegou num nível que é bater ou morrer. Prefiro bater.

Também ontem, por Whatsapp, um amigo me dizia que tinha se atirado no chão do seu carro, as sete da noite, na estrada para Itaipu, perto da “comunidade” do Cantagalo (outro reduto de votos) localizada perto do cemitério Parque da Colina. Ele me disse que dois homens sem camisa atravessaram a estrada atirando a esmo. Isso mesmo, sem mais nem menos. Atiravam para cima, para os lados. Meu amigo se jogou no chão e ouvia os tiros sem nada poder fazer.

Estou indignado, furioso, por causa do Magaldi, do amigo no chão do carro, de um amigo-irmão Alex Mariano, e, principalmente, pela visível decadência da minha cidade, que divide pouco mais de 700 PMs com Maricá! Sim, o 12º. Batalhão da PM, que chegou a ter 1.700 militares em 1974 (antes da fusão) hoje tem 700 e poucos e racha com Maricá que, como Niterói, também e governada pelo PT.

O pior que essa barbárie está apenas começando.


Quem se dá bem com a crise econômica brasileira

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Por pura e notória incompetência dos dois governos de Dilma Rousseff, o Brasil está mergulhado numa crise econômica que atinge todos os setores. A temível dobradinha recessão-inflação já é fato, o desemprego está em alta, enfim, além de à deriva o navio continua fazendo água.
Mas, sempre há muita gente se dando bem com o fracasso do Brasil. Gente que é chamada de abutres. Confira uma pequena lista de alguns setores (não são todos) que adoram ver o país na lama.

Corruptos – esses hediondos personagens estão sempre com o boi na sombra. Mesmo os que estão presos pela Operação Lava Jato, sabem muito bem se virar nas piores (para eles) situações. Perdem agora, mas deixam sempre um bom naco depositado em algum lugar e logo que os processos acabam (ou cumprem a condenação na prisão) voltam a corromper, mais atentos e fortes.
Já os corruptos que estão soltos (e não são poucos), em todas as esferas dos governos Federal, Estadual e Municipal, continuam roubando como sempre. Não se impressionam com nada já que, onipotentes (uma característica comum na espécie) se sentem acima do mal. Mesmo quando são flagrados, presos e julgados não perdem a pose jamais.

Bancos –Quanto mais inflação, juros, recessão, melhor para os bancos, instituições que não param de enriquecer diante de qualquer cenário. Se o Brasil vai bem, eles festejam, se está mal, idem. A história mostra que as crises no Brasil já quebraram tudo, menos bancos, que só fecharam por trambiques de seus donos ou por má administração.

Maus políticos – Com o noticiário centrado na crise econômica, na corrupção e outros temas específicos, os holofotes da mídia deixam os maus políticos relativamente em paz. A ausência da mídia facilita negociatas, acordos espúrios, tudo na sombra, no eclipse, na penumbra, como eles gostam.

Mercado de Câmbio – Os chamados doleiros estão em orgasmo. Com o dólar quase batendo os R$ 3,30, estouram garrafas de champanhe, por motivos óbvios. Em off, trabalhando na surdina, muitos desses doleiros fazem parte da chamada “central de boatos”, aquele disse me disse especulativo que visa, única e exclusivamente, jogar o dólar mais para cima ainda.

Exportadores – toda a indústria e comércio voltados para a exportação, fatura muito alto em tempos de explosão do dólar e euro. Mercado externo de aviões, automóveis, eletrodomésticos, etc. Só não faturam mais porque o governo, burro, atrapalha com seis impostos, taxas, burocracia.

Palácio do Planalto - ................................ (preencha você mesmo).




Niterói: a sensação de abandono numa cidade rendida pela violência

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No velório do vereador Carlos Magaldi, um misto de revolta com tristeza era geral. O presidente da Câmara dos Vereadores, Paulo Bagueira, que era muito amigo de Magaldi, disse que “é preciso dar uma basta no que está acontecendo. Sinto a PM enxugando gelo nas ações que realiza. É necessário mais. Uma ação articulada entre todos os setores da segurança pública para frear está onda que atemoriza o cidadão de bem e que torna as famílias reféns desses bandidos”

Magaldi tinha 67 anos e foi vereador por oito legislaturas. Ele foi assassinado no início da tarde de ontem (sexta-feira) numa tentativa de assalto no bairro de Camboinhas, na Região Oceânica de Niterói.

O Fluminense, o maior jornal de Niterói, tem feito uma excelente cobertura sobre o caos na segurança pública que atinge a nossa cidade. No site do jornal, www.ofluminense.com.br, aparecem as reportagens mais lidas nas últimas horas. Pela ordem:

- Ex-vereador Magaldi é assassinado em Camboinhas.

- Criminalidade desafia a polícia e volta a aterrorizar. Em Icaraí, homem é baleado durante arrastão. No Fonseca, trabalhadores ‘levam dura’ de assaltantes e têm seus pertences levados. No Cubango, bandidos ostentam armas.

- Rajada de tiros assusta moradores em Santa Rosa. Após uma incursão da PM na comunidade Souza Soares em Santa Rosa no final da tarde desta sexta-feira, criminosos efetuaram disparos, mas ninguém ficou ferido ou foi preso.

- Arrastão e um baleado na Zona Sul de Niterói. Criminosos praticaram assaltos em São Francisco e Icaraí, deixando um homem baleado na Rua Ministro Otávio Kelly. A dupla ainda conseguiu fugir para Santa Rosa.

- Roubo de celulares aumenta em Niterói, segundo o ISP. Índices são referentes ao mês de fevereiro em comparação com o mesmo período do ano passado.

A sensação da população é de abandono. O avanço da bandidagem em Niterói é assunto em rodas de conversas em todos os bairros entre pessoas de todas as idades. Depois das 10 da noite, o “estado de sítio” informal imposto pelos bandidos deixa as ruas desertas, tristes, um retrato do estado emocional da população.

Fui informado que o número de militares no 12.o Batalhão da PM não chega a 700. Para piorar, Niterói divide esse efetivo com a cidade de Maricá. Há 40 anos atrás, eram mais de 1.500 militares só para atender Niterói.

Essa é uma das respostas a lúcida afirmação do presidente da Câmara quando afirmou que “sinto a PM enxugando gelo nas ações que realiza”. Mais: o número de bandidos cresce assustadoramente em decorrência das UPPs na capital. Niterói virou abrigo para os bandidos que fogem do Rio e muitos invadiram favelas como a do Preventório, que antes era pacífica.

A população de rua só cresce e leitores desta Coluna informam que são molestados por pessoas que vieram de fora e habitam a calçada da esquina de ruas Alvares de Azevedo e Moreira César e muitas outras.

Pagamos impostos altíssimos, sustentamos um estado inchado, gastador, voltado exclusivamente para a capital, Rio de Janeiro. Está mais do que na hora de cobrar das autoridades do Poder Executivo, do Estado e da Prefeitura, que sejam tomadas medidas urgentes e, sobretudo, concretas contra esse flagelo. Não dá mais para esperar.

Não merecemos essa macabra lambança que aí está. Nem nossos filhos, nem a nossa cidade.







Ouvindo Neil Young nas primeiras horas do outono

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                                                                       Old Man
                                                                     (Neil Young)
                                                                        Old Man
                                                             Old man look at my life
                                                              I'm a lot like you were
                                                             Old man look at my life
                                                              I'm a lot like you were
                                                              Old man look at my life
                                                    Twenty four and there's so much more
                                                              Live alone in a paradise
                                                              That makes me think of two
                                                              Love lost, such a cost
                                                              Give me things that don't get lost
                                                              Like a coin that won't get tossed
                                                              Rolling home to you
                                                              Old man take a look at my life
                                                              I'm a lot like you
                                                        I need someone to love me the whole day through
                                                              Ah, one look in my eyes
                                                              and you can tell that's true
                                                              Lullabies, look in your eyes
                                                              Run around the same old town
                                                              Doesn't mean that much to me
                                                              To mean that much to you
                                                               I've been first and last
                                                               Look at how the time goes past
                                                               But I'm all alone at last
                                                               Rolling home to you
                                                               Old man take a look at my life
                                                               I'm a lot like you
                                                               I need someone to love me
                                                               the whole day through
                                                               Ah, one look in my eyes
                                                               and you can tell that's true
                                                               Old man look at my life
                                                               I'm a lot like you were
                                                               Old man look at my life
                                                               I'm a lot like you were
Há muito tempo não ouvia as trovoadas. Sim, elas ainda existem e me causam alívio enquanto leio os jornais que derramam baldes e mais baldes de desesperança.

Em vez de alimentar o assunto prefiro pegar uns CDs de Neil Young e por no computador. Para mim, CD é a melhor mídia já inventada. Prático, não tem a famigerada agulha do vinil e seu irritante plec plec plec, não trava, não exige que eu levante para mudar de lado, dispensa lavagens, etc. No CD o som sai puro e me satisfaz plenamente.

Tanto que em mil novecentos e noventa e tal doei meus vinis (não eram poucos) para uma instituição de caridade que fez uma boa grana. Amigos, colegas e conhecidos que cultuam o vinil ficam horrorizados quando conto essa história, mas fazer o que se o que resta nesse país (pelo menos por enquanto) é a liberdade de escolha?

Logo, ouço sim muitos CDs e no carro, em breve, estarei ouvindo pen drive assim que alguém que conhece mais informática do que eu puder informar se posso transferir arquivos fechados para o dispositivo. Em outras palavras, se eu espetar o pen drive na entrada USB do som do carro, terei a opção de ouvir, por exemplo, a faixa 9 ou ele lê todas as músicas como arquivo único?

Assisti Neil Young no Rock in Rio em 2001, show bombástico. Ele empunhava sua lendária guitarra Gibson Les Paul preta, chamada “Old Black” safra de 1953, que não larga por nada. Show pesado, alto volume, distorcido, catártico, como eu estava naquele dia. Viajei horas até chegar ao Rock in Rio e consegui um lugar bem próximo ao palco porque esse negócio de ficar assistindo telão não dá. 

Lembro da expressão da plateia que não conhecia Young, muita gente mais nova, atônita, aplaudindo boquiaberta a performance sempre comocional do músico, que lá pelas tantas, inesperadamente, começou a esfregar a guitarra contra o cabeçote de um dos amplificadores gerando sons difusos, alguma microfonia, caós.

A segunda trovoada acaba de rugir lá fora e uma chuva bem leve banha o entorno. Neil Young toca no computador enquanto lembro de uma manhã de 1981 ou 1982. O então presidente da Warner, André Midani, ligou convidando para uma sessão exclusiva do filme “Rust Never Sleeps”, um show completo de Neil Young extremamente bem feito. Foi numa cabine na Cinelândia, Rio. O filme, apesar de sensacional, não foi exibido no Brasil por uma razão óbvia: na época, ninguém sabia quem era Neil Young. E a pergunta que me cai agora, bem mais forte do que a chuva é “será que hoje sabem de quem se trata?”. Pelo menos hoje existe Google, Yahoo, Bing.

Termino a audição e vejo o jornal em cima do sofá, exibindo as lambanças no país. Melhor jogar fora e sair para ver a chuva na praia porque afinal de contas circula um boato garantindo que os domingos ainda existem.



Um culto aos decibéis

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O Globo online publica que show no Japão será o último do lendário Black Sabbath.


Lembrei de um artigo que escrevi há 30 anos “apresentando” os metaleiros ao grande público. Convidado pela revista Veja, escrevi um ensaio que foi publicado na edição de 16 de janeiro de 1985, seção “Ponto de Vista” – páginas amarelas. Leia abaixo.                                                     
   Ozzy Osbourne: comedor de morcegos?
                    Um clássico do rock
Chegou a hora dessa gente esverdeada mostrar seu valor. Finalmente a partir de 21 de janeiro, o day after do rock in Rio, o país terá que conviver com uma estranha tribo. Uma tribo de roqueiros que tem no heavy metal sua base existencial e a ele se entrega como a um deus urbano e contemporâneo.

Esses rockers, conhecidos entre nós como metaleiros, são absolutamente peculiares e vivem uma puberdade conflitante e confusa como todos os adolescentes. Além de serem discriminados dentro de casa (de certa forma a causa que os levou ao encontro dos “heavy deuses”), os metaleiros acabaram sitiados numa caverna onde somente outros metaleiros são capazes de descobri-los. Dentro do rock eles também são arremessados para o subsolo por outros roqueiros de outras tribos que veem nos metaleiros apenas um bando de débeis mentais.

O Brasil, hoje, tem mais de 100 mil desses garotos que buscam na mais ensurdecedora das guitarras a catarse que muitos barbados procuram, por exemplo, dentro da psicanálise. Em sua maioria, vivem a margem das cidades, compondo uma espessa parede de compreensões que acaba transformando o grito em linguagem e o sangue (artificial) em forma de expressão.

São amantes da fantasia. Sabem que os integrantes do Kiss são vegetarianos, não bebem e não se drogam. Mas preferem acreditar num Kiss que mata pintos sobre o palco, se embebeda sem parar e no final destrói os hotéis por onde passa. Os metaleiros sabem que os Scorpions vivem com mulheres e filhos mas preferem vê-los como um grupo que adora jaulas com cobras e aranhas venenosas, além de intermináveis orgias.

Em bando eles se juntam (só homens) para audições coletivas de obras fonográficas decibélicas e depois saem as ruas em busca de filmes de terror ou de qualquer obra do diretor Steven Spielberg, ídolo de todos, nas telas. E, apesar das pulseiras cheias de pregos e tachinhas, cabelos enormes, roupas de couro ou curvim, correntes e cadeados espalhados pelos braços, os metaleiros não são violentos nas ruas.

São porém capazes de tudo dentro de um recinto fechado, principalmente se ali estiverem se apresentando bandas ao vivo. Se um desses grupos tocar algo distante do que os metaleiros entendem como rock, não restará cadeira sobre cadeira.

Cercados entre os tensos e intensos 12 e 18 anos de idade, os metaleiros querem que o Brasil se dane. Para eles, os políticos não passam de ladrões, os generais de “canas“  e só comparecem a comícios se os oradores partirem para o total radicalismo.

Esses garotos, responsáveis pelo sustento-base das gravadoras (os discos internacionais mais vendidos em todo o mundo são de heavy metal), não leem jornais, considerados farsas. São alienados profissionais e acham que uma letra do grupo AC/DC vale mais que um editorial em qualquer jornal do mundo.

Temem o sexo, optando pela masturbação. Temem a mulher, optando pelo machismo, que é pregado fartamente nas letras de seus grupos prediletos. Só não temem três coisas: pai, mãe e polícia. Recentemente o músico Lobão, do grupo Lobão e os Ronaldos, fez declarações grosseiras sobre os metaleiros.

Mas não foi só ele quem falou e fala mal dessa tribo. Muitos músicos de outras facções não cansam de tentar espatifar ou rachar esse grupo que não acredita em poder. Em contrapartida, parece que, em caso de vingança as palavras de ordem dos metaleiros são “lata no palco e desprezo nas ruas”.

Os metaleiros serão muito mais numerosos depois do Rock in Rio, mas o Brasil não precisa temê-los. Eles só querem rock pesado e uma gravação pirada no Thin Lizzy. São ou serão eleitores de votos nulos, se drogam pouco (no máximo maconha) e querem que vá tudo, literalmente, para o inferno. O inferno para eles é o céu. Parece que o demônio é rei, mas também dentro da fantasia.

A religião, propriamente, nunca chegou perto dos metaleiros mais próximos dos rituais hollywoodianos, pintados pelos grupos em suas músicas. Eles não tem e não querem formar opinião sobre coisa alguma. Difícil é a situação dos pais desses garotos. Entre um psiquiatra e outro, para onde costumam arrastar seus metaleiros, acabam, convencidos que esse barulho todo não passa de uma fase adolescente do roqueiro, que só se eterniza entre os profissionais e assim mesmo na base da cenografia. Afinal, quando Ozzy Osbourne enforca anões no palco e arranca cabeças de morcego com os dentes, ele próprio sabe que isso não passa de uma grande e lucrativa piada. Só que, no início da carreira, o grupo ao qual pertenceu se envolvia com magia negra e transcrevia suas experiências nos discos.

Tentar entender os metaleiros é tentar desvendar mistérios adolescentes. Eles estão presentes no mundo inteiro, colocando abaixo promessas e perspectivas e endeusando o que não existe. Acima de tudo, o movimento cresce pela falta de ídolos universais. Parece mais confortável acreditar no que não existe dos que nas alianças políticas entre gregos e troianos ou na inflação de 300%. Em última análise, os metaleiros não fazem mal a ninguém. Só que também não acreditam em ninguém.               

Quando a avenida Brasil elegeu Nebraska, obra prima de Bruce Springsteen

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A avenida Brasil parece íntima, mas não é. Nos anos 1970, 80, 90, 2000, subi e desci suas pistas literalmente milhares de vezes. Em busca de notícias, de mulheres que me incendiaram, casas de amigos. Conheço cada pista, cada palmo, cada faixa, mureta da avenida Brasil, mas ainda a estranho. Por que? Porque ela sempre me estranhou e vai me estranhar sempre.

Se eu fosse Bruce Springsteen teria composto Nebraska, obra prima, em algum ponto daquela torta avenida e seu asfalto roto que liga a tristeza a esperança, o sorriso ao nó na garganta, o nada ao lugar nenhum, nervos nublados a euforia existencial. Façam os jogos, senhores. A avenida Brasil é o pano verde de cada dia, onde milhares de pessoas jogam todas as suas fichas, dia sim o outro também.

Nebraska, canção que abre o álbum, fala de um degenerado executado na cadeira elétrica. A avenida Brasil também olha, prende, julga, condena e mata. E não é preciso ser o degenerado descrito por Springsteen. Basta ser gente. Gente que vai e não volta. Gente que volta e não vai. Os sulcos da avenida, volta e meia salpicados de sangue, jogam na vala. Vala comum. Vala incomum.
Avenida Brasil, Nebraska nosso de cada dia. Sem gaita, sem voz, sem violão. Apenas um som, ermo, brusco, surdo, como os baques, os beijos, o soco, a bruma, a fumaça. Nebraska, sim.

Sempre.                                                                     

Projeto Cine Jazz retorna ao Museu do Ingá nesta quinta-feira

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    Herbie Hancock
     Museu do Ingá
    Paulo Renato Rocha
Um dos mais importantes projetos musicais do país é o “Cine Jazz”, criado pelo produtor e pesquisador musical Paulo Renato Rocha, uma das maiores autoridades brasileiras em música instrumental que conheço.

O projeto Cine Jazz está de volta ao Museu do Ingá e a primeira edição deste 2015 acontece nesta quinta-feira, as 19 horas, com a exibição de um filme de uma apresentação do pianista Herbie Hancock, realizada em Bremen, Alemanha, em 1974. No show o pianista é acompanhado pelo grupo de jazz-funk The Headhunters.

O musico convidado desta reestreia Arthur Maia, um dos maiores baixistas do mundo, que participa de uma palestra após a exibição do filme e se apresenta em um pocket show encerrando o evento.

O projeto “Cine Jazz” tem curadoria do produtor e pesquisador musical Paulo Renato Rocha e tem apoio da Secretaria Municipal de
Cultura, do Museu do Ingá (FUNARJ) e da Calvin Comunicações. Entrada gratuita, classificação indicativa, 14 Anos

O que é

“Cine Jazz” é um evento multimídia que reúne exibição de filme, palestra e pocket show. A proposta básica é democratizar e ampliar o público do workshop, tornando-o acessível aos leigos e amantes da música que não dominam a técnica e a teoria musical, através de um formato didático mais atraente e original.

Projeção do filme dura 30 minutos e aborda tema e instrumento específico, seguido de palestra e pocket show com o artista convidado, em edições mensais.

O objetivo é atrair e incentivar formação de plateias interessadas na história e no desenvolvimento de estilos musicais tradicionais e músicos consagrados, pouco divulgados pelas mídias convencionais, como o jazz, a bossa nova e a musica instrumental brasileira.

Paulo Renato Rocha é jornalista e produtor musical carioca. Em 1968  ingressa no Colégio Santo Inácio em Botafogo, torna-se  amigo de Bilinho Blanco e passa a frequentar a casa do compositor Billy Blanco, um dos mentores do movimento Bossa Nova. Em 1972 a família muda-se para Niterói, onde conhece o produtor Aloysio Reis que o leva  para a CBS Discos (Sony Music) em 1977.

Assessor de Imprensa do cast internacional da gravadora trabalha com artistas de renome internacional como Gerry Mulligan, Dexter Gordon, Weather Report, John McLaughlin, George Duke e Earth Wind & Fire.

Em 1982 torna-se produtor musical na Danceteria Mistura Fina (Itanhangá) e trabalha com os grupos da nova cena rock que então impera no país: Legião Urbana, Titãs, Ultraje a Rigor, Lobão, e Barão Vermelho.

Em 1984 o guitarrista Victor Biglione o contrata para ser o diretor artístico da sua recém aberta casa The Tinker, no Leblon, e lá produz  shows da então crescente cena da música instrumental brasileira:  Marcio Montarroyos, grupo Azymuth, Ricardo Silveira, grupo Garage, Hermeto Pascoal, Celso Fonseca, grupo Cama de Gato, etc.

No final de 1985 é contratado pelo recém aberto Jazzmania, famoso clube de jazz de Ipanema. Na casa, além de produzir  temporadas de artistas como Wayne Shorter, Joe Pass, Toots Thielemans, Wynton Marsalis e Pat Metheny, arregimenta e produz, no final dos anos 80,  jam sessions  com músicos brasileiros e estrangeiros participantes do extinto Free Jazz Festival, entre eles  Art Blakey, Max Roach, Herbie Hancock, George Benson, Robertinho Silva, Grover  Washington Jr., Raul de Souza, Branford Marsalis, Mauro Senise, Ron Carter, Nico Assumpção, Tony Williams, Raul Mascarenhas, Jimmy Smith, Joe Sample,  Carlos Malta e Marcus Miller entre muitos outros.

De 1988 a 1990 produz e apresenta o programa “Studio 92 O instrumental Contemporâneo” na rádio Globo FM, com o melhor da música instrumental. Em 1993 ocupa o cargo de Diretor Artístico do selo Niterói Discos, da Prefeitura de Niterói,lançando nos anos seguintes mais de 100 títulos com os trabalhos de artistas como, Marcos Nimrichter, Dino Rangel e Kiko Continentino.

De 1999 a 2001 produz o projeto Palco Livre da MPB, da Prefeitura de Niterói, coordenado pelo cantor e compositor Sergio Ricardo. De 2008 a  2010 ocupa o cargo de Stage Manager  (Diretor de Palco) do Teatro Municipal de Niterói. Em 2011 cria e produz o projeto multi-mídia Cine Jazz no MAC Museu de Arte Contemporânea de Niterói. Desde 2013 é o curador do projeto Cine Jazz UFF que acontece mensalmente no Museu do Ingá em Niterói com apoio da FUNARJ.


De 4 a 7 de dezembro de 2014 organiza e faz a curadoria do 1º Festival Niterói Cine Jazz UFF , uma realização da Secretaria Municipal de Cultura de Niterói e do Centro de Artes da Universidade Federal Fluminense, que reúne no Teatro do Centro de Artes artistas como Jaques Morelembaum, Lula Galvão, Tutty Moreno, Nivaldo Ornelas,  Pascoal Meirelles, Osmar  Milito, Sérgio Barrozo, Paulo Braga, Marcelo Martins e um cast de grandes artistas da música instrumental brasileira.

Facebook: uma faca, vários legumes

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Nunca ouvi falar de ninguém que tenha entrado no Facebook à força. Mesmo nas remotas calotas polares. Num linguajar mais singelo: senta na janela quem quer. Mas está mais claro do que cloro de piscinão que os desavisados, mal informados, displicentes, desatentos, vacilões e similares que meterem a cara ali sem saber como aquilo funciona vão entrar em festa de pênis fantasiados de glúteos. Sem direito a beicinho e reclamação.

Só recentemente percebi que já estou dominando (estranha essa definição) 70% do Facebook, mas ainda assim minha página é invadida por convites que não me interessam, pessoas compartilham vídeos, músicas e textos que não tem nada a ver comigo, aqueles joguinhos patifes, mas não reclamo. Já fui lá na tal central de ajuda e vi que não há solução para essas desagradáveis postagens porque o Facebook não vê nisso um problema. Afinal, é uma rede social, com sua dose de “bunda na janela” que toda rede social tem. Em outras palavras, não dá para fazer retiro espiritual num show do Motorhead ou numa corrida de Fórmula 1.

Há tempos rolou um problemão no meu FB. Aleatoriamente, sem perguntar nada a ninguém, o sistema saiu deletando um monte de amigos da minha lista. Fui saber do problema através de um deles que me mandou um e-mail do tipo “pô, você me deletou do Facebook? Fiz alguma coisa errada? (...)”. Respondi imediatamente que não sabia que as pessoas estavam sendo degoladas virtualmente na minha varanda e expliquei que o Facebook é uma faca cortando vários legumes. Muitas vezes de forma aleatória, logo, injusta. Pedi desculpas, readicionei o cara à minha lista e segui em frente.

Outras pessoas reclamam (aliás, o grande defeito do FB é o volume de reclamações existenciais) que o sistema está muito popular “cheio de gente brega”. Peraí, cara pálida! O mundo é brega. Basta olhar o hit parade musical do Brasil, Inglaterra, Estados Unidos, bem como o Ibope dos programas de TV estilo mundo cão, enfim, essas redes sociais são uma maquete do mundo, com uma opção: pode-se não ler as baranguices que sempre surgem por ali ou simplesmente deletar a pessoa da lista. Ou, então, em caso de extrema irritação, pular fora do Facebook que, lembrando, em nenhum momento obrigou ninguém a frequentá-lo.


Os que tratam o Facebook como um diário secreto, é bom lembrar que a rede social é uma mídia poderosíssima e que em pesquisas recentes a empresa que o criou descobriu que a maioria dos usuários passa horas, dias, semanas só observando, contemplando os desabafos, movimentos, condições, sem dar um pio. Milhões de pessoas ficam atrás das cortinas digitais vendo o circo pegar fogo. Para quem não se importa com a devassidão existencial, tudo bem, mas aqueles que não gostam de se expor, antes de digitar a primeira letra melhor contar até 100.

O suposto copiloto que derrubou o Airbus: verdade ou precipitação?

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Concordo totalmente com o amigo, colega e mestre, jornalista Romildo Guerrante, que acha prematuras as informações que condenam o copiloto da Germanwings, que teria derrubado de propósito o Airbus com 150 passageiros na França.

Leiam os posts dele Romildo no Facebook:

“Duvido da hipótese porque não veio de nenhum técnico envolvido na investigação que mal começou. Nos casos anteriores bem explícitos foi manifestação de egolatria de psicopatas”.

"Essas informações sobre família, amigos, namorada, tudo isso é fácil. Mas saber que o comandante (era o comandante?) usou uma machadinha pra tentar entrar na cabine; que o copiloto mexeu nos comandos para derrubar o avião (tem imagem? como o áudio pode mostrar isso se o cara não abriu a boca?); como é que um promotor de justiça e o ministro dos transportes atropelam a investigação que é técnica e saem na frente afirmando que a causa foi suicídio? 

Pra que suicidar-se de forma tão complicada, perdendo altura lentamente? Bastava pra ele, se estivesse acordado e não desmaiado por alguma razão, virar o avião de dorso e dar adeus. Não explicaram ainda o acidente com outro Airbus, da Air Asia e agora vem esse outro. Do Asia eles nem divulgaram o resultado da caixa-preta. Tá muito cedo. Tem muita investigação pela frente.”

“Eu era repórter do JB e fui cobrir um acidente de ônibus que matou 28 pessoas em Três Rios. Um passageiro enlouqueceu ao raiar do dia, levantou-se e puxou o volante. O ônibus caiu no rio. Ele disse depois ao delegado que havia uma conspiração no ônibus para matá-lo, e que o motorista era o chefe.”

Romildo tem razão. Bons jornalistas como ele, com décadas de apuração, entrevistas, checagem de fatos, suspeitam quando em questão de horas um acidente tão complexo, confuso, enigmático, tem suas causas reveladas.

De fato, como se sabe que o copiloto mexeu nos instrumentos se ninguém viu, não há imagem e nem áudio mostrando? Baseadas em que as autoridades partiram para a hipótese de um suicídio do copiloto.

Por outro lado (há sempre um outro lado, em qualquer notícia), a Germawings diz que não há nenhum documento atestando incapacidade psicológica do copiloto que estaria sem condições de voar. Ele teria destruído os documentos. A empresa pode estar falando a verdade, mas sempre é bom lembrar que caso fique provado que o avião foi atirado no chão por um copiloto que deveria estar de licença médica, todas as indenizações relativas aos mortos desabam sobre a ela, a empresa aérea. Por isso, é sempre melhor (para elas) e também para os fábricantes de aviões quando fica comprovada a “falha humana”. Toda a dinheirama relativa a indenizações decorrentes de problemas no avião ou não companhia aérea ficam automaticamente anistiadas.

É lógico que há fortes evidências sobre a participação do copiloto na queda do Airbus da Germanwings, mas prefiro seguir a trilha do amigo Romildo Guerrante e esperar os resultados oficiais da perícia. Até lá, por mais fortes que sejam os sinais, estaremos literalmente sobrevoando o terreno das especulações.

Querem destruir o bairro de Itacoatiara, em Niterói, e ninguém está fazendo nada para impedir

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    Verão
    Fim de tarde


Itacoatiara fica a 25 quilômetros do centro de Niterói. Ainda é um bairro bucólico, cheio de árvores, pássaros, casas clássicas, crianças brincando nas ruas de terra batida. Foi a paz deste pequeno bairro que atraiu um pequeno grupo de pessoas para lá, nos anos 1950. Por causa da abundância de verde, a temperatura média é de três graus a menos do que em Icaraí.

Em busca de paz, silêncio, qualidade de vida, essas pessoas aproveitaram que a praia tem mar bravio, instável, difícil (o que espantava os banhistas) e construíram seus sonhos por lá. Distante, selvagem, Itacoatiara vivia a sua vida tranquila, sua praia frequentada basicamente por surfistas e moradores de Niterói e contava com a vigilância constante, implacável e extremamente necessária de uma associação de moradores atuante e radical. Ainda bem.

Mas parece que o sonho acabou. O que era puro romantismo, sonho, quase utopia, vai ganhar um calçadão, mirante moderno, banheiros químicos, enfim, Itacoatiara será favelizada com o que ar de pior em matéria de urbanismo  predatório, oportunista. As cartas estão sendo jogadas, abrindo caminho para prováveis futuras ações da especulação imobiliária que nunca se conformou com o fato de ser proibido construir prédios no bairro.

Calçadão, mirante, banheiros químicos são os abre alas para a devastação imobiliária. Mais: por leniência das autoridades, nos fins de semana do verão Itacoatiara é invadida por uma horda de farofeiros, meliantes e vagabundos em geral pessoas que não tem qualquer vínculo com o bairro que depredam sem pestanejar.

Urinam e defecam nas calçadas, jogam futebol na areia tirando a paz dos outros banhistas, copulam na restinga, ouvem música de péssima qualidade em alto volume enlouquecendo os moradores. É para eles que Itacoatiara será destruída. No lugar da restinga selvagem, um calçadão. No lugar de uma praça bucólica, um mirante, mais banheiros químicos, muito funk aos berros e, quem sabe em breve, edifícios.

O estranho nessa bizarra história é a falta de reação da maioria dos moradores.  Não consigo acreditar que os locais, pessoas que optaram pela qualidade de vida, estejam aceitando esse linchamento urbanístico. Mas se quem cala consente, o que pensar?

O Sal da Terra

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    Camboinhas


Ando cheio da palavra sustentabilidade, usada como galocha pela politicalha e mídia em geral. Outra que não suporto mais é o tal do “foco”. Leio e ouço toda hora “meu foco está em...”; é dose.

Antes de virar moda e frase de panfletos eleitorais oportunistas, pessoas que hoje são chamadas de ambientalistas foram tachadas de ecologistas nos anos 70. Fui um dos fundadores do M.O.R.E., Movimento de Resistência Ecológica que atuava basicamente em Niterói em plena ditadura. Nunca presidi o M.O.R.E. mas tive uma atuação constante e muito intensa porque desde pequeno meu pacto com a natureza é real, palpável e quem me conhece sabe disso.

Lembro de uma grande manifestação organizada por um colega jornalista, acho que em 1977, na área de Camboinhas, bairro da Região Oceânica de Niterói. Na época uma megaconstrutora estava tocando um projeto chamado “Cidade de Itaipu”.

Para “limparem” a área contrataram jagunços que mataram e torturaram pescadores que foram obrigados a entregar suas casas. A lagoa de Itaipu estava ameaçada (hoje está morta), enfim, o megaprojeto teve que engolir uma manifestação com direito a presença do cientista Augusto Ruschi (1915-1986).

Dezenas de pessoas participaram da carreata e, lógico, havia policiais do sucessor do Dops, o também famigerado D.P.P.S. (Delegacia de Polícia Política Social) infiltrados fotografando todo mundo mas, ainda assim, consegui escrever uma longa matéria para o Pasquim (na época submetido a censura prévia) que até hoje não entendi como não foi degolada.

As manifestações, as matérias na grande mídia que seguiram o Pasquim acabaram abortando a tal “Cidade de Itaipu” e, em tese, a ecologia (hoje ambientalismo) venceu mais uma. Foi quando um mineiro de Belo Horizonte me procurou no Pasquim, que funcionava na rua Saint Roman, em Copacabana. Eu ia lá uma vez por semana e, inclusive, sem querer, presenciei a despedida de Ivan Lessa, em 1978, que jurou nunca mais pisar no Brasil embarcando para Londres. Ele morreu em 2012 com a promessa cumprida.

Mas voltando ao mineiro, ele queria mais detalhes sobre o nosso movimento que abateu a “Cidade de Itaipu” para conversar com o poeta Ronaldo Bastos sobre o assunto. Contei tudo o que sabia mas o cara sumiu. Foi quando em 1981 uma música me chamou atenção. Chamou-se “O Sal da Terra”, que ouço neste momento com o coautor Beto Guedes enquanto escrevo.

Há quem diga que o tal mineiro era Beto Guedes que escreveu “Sal da Terra” em homenagem ao meio ambiente. Não sei. Até estive com ele algumas vezes anos depois mas não confirmei a informação. O importante é que a música é linda, a letra fabulosa e toda luta sincera, honesta e justa vale a pena.

O general Simon Bolívar foi um grande coxinha que queria ser o supremo ditador da América do Sul

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Ouvindo “No Quarter”* na lentidão safada do trânsito de manhã cedo, penso numa releitura que fiz recentemente. Uma biografia importantíssima que atira em seu devido lugar o Elvis Presley do golpista e coronel Hugo Chaves e de seu ovo direito Nicolás Maduro. Pouca gente leu a biografia “Simon Bolívar por Karl Marx” (sim, ele mesmo) que tira pela cabeça a cuequinha de herói dos pobres que vestiram em Bolívar.

Os historiadores contemporâneos e democratas nunca esconderam que o general Simon Bolívar foi um patife, tanto que é ídolo de outros patifes, da Venezuela e fora dela. Até no Brasil existem bolivarianos, como sabemos, gente vadia que clama de joelhos por um golpe de estado para botar o saco na lagoa, o boi na sombra e a grana na Suíça.

Origem desse “herói” coxinha, absolutamente coxinha, segundo o olhar firme e implacável de Karl Marx. Nascido na Venezuela, Simon Bolívar “era filho de uma das famílias mantuanas que, no período da supremacia espanhola, constituíam a nobreza crioula da Venezuela. Em consonância com o costume dos americanos ricos da época, ele foi mandado para a Europa aos 14 anos de idade. Da Espanha, seguiu para a França e residiu em Paris por alguns anos.

“De pé sobre um carro triunfal, puxado por doze jovens vestidas de branco e enfeitadas com as cores nacionais, todas escolhidas entre as melhores famílias de Caracas, Bolívar, com a cabeça descoberta e uniforme de gala, agitando um pequeno bastão, foi conduzido por cerca de meia hora, desde a entrada da cidade até sua residência. Proclamando-se ‘Ditador e libertador das Províncias Ocidentais da Venezuela’, formou uma tropa de elite que denominou de sua guarda pessoal e se cercou de pompa própria de uma corte.

“Entretanto, como a maioria de seus compatriotas, ele era avesso a qualquer esforço prolongado e sua ditadura não tardou a degenerar numa anarquia militar, na qual os assuntos mais importantes eram deixados nas mãos de favoritos, que arruinavam as finanças públicas e depois recorriam a meios odiosos para reorganizá-las.” 

Basicamente, isso é Bolívar, herói latino-americano dos oportunistas que se dizem, inclusive, socialistas. Só rindo. Voltemos ao livro:

“O que Bolívar realmente almejava era erigir toda a América do Sul como uma única república federativa, tendo nele próprio seu ditador. Enquanto, dessa maneira, dava plena vazão a seus sonhos de ligar meio mundo a seu nome, o poder efetivo lhe escapou rapidamente das mãos.”

 “Em 1817, Bolívar com um tesouro de uns 2 milhões de dólares, obtidos dos habitantes de Nova Granada mediante contribuições forçadas e dispondo de uma tropa de aproximadamente nove mil homens, um terço dos quais compunha-se de ingleses, irlandeses e outros estrangeiros bem disciplinados, coube-lhe então enfrentar um inimigo despojado de todos os recursos e reduzido a uma força nominal de 4.500 homens, dois terços dos quais eram nativos e, por conseguinte, não podiam inspirar confiança nos espanhóis.

“[...] Se Bolívar tivesse avançado com arrojo, suas simples tropas europeias teriam esmagado os espanhóis, porém ele preferiu prolongar a guerra por mais cinco anos.”


    *Versão remasterizada por Jimmy Page na versão de luxo do álbum “Houses of the Holy”, Led Zeppelin.


A trairagem dos governos com os pracinhas da FEB. O Brasil de Vargas não mereceu os seus heróis

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Acabei de ler o livro “1942 – o Brasil e sua guerra quase desconhecida”, de João Barone. Ele mesmo, o baterista dos Paralamas do Sucesso, que é também um especialista em Segunda Guerra Mundial e que, gentilmente, me presenteou em mãos com um exemplar autografado.

Impressionante a história dos milhares de brasileiros que foram lutar na Itália. De 1942 a 1945, os “pracinhas” como ficaram conhecidos lutaram bravamente contra os nazistas. Muitos morreram, muitos ficaram gravemente feridos, mas venceram a guerra, voltaram e foram humilhados por Getúlio Vargas, na época ditador.

Ponderado, Barone conta que Vargas demorou a decidir lutar ao lado dos Aliados, sorrindo como Monalisa, simultaneamente, para Hitler, Mussolini e para os norte-americanos. Alguns historiadores contam que graças a dinheirama para a construção da Siderúrgica de Volta Redonda, o ditador vendeu o passe do Brasil para os norte-americanos, o que teria deixado Hitler furioso.

A história que João Barone conta parece secreta porque a imagem que nos passam dos pracinhas está longe de ser positiva. Muito longe. Nunca entendi porque, mas agora a conta fechou. Vargas, vejam vocês, achava que assim que chegassem os comandantes da FEB (Força Expedicionária Brasileira), lideradas pelo marechal Mascarenhas de Morais iam dar um golpe de estado. Mais grave: devido a euforia popular com o desfile dos pracinhas pelo Centro do Rio, o ditador achou que eles estavam ofuscando a sua imagem, e proibiu manifestações acaloradas.

Com relação ao golpe de estado de novo, mais uma vez o ditador errou. Foi enxotado em 29 de outubro de 1945 por um movimento militar liderado por generais que compunham seu próprio ministério e que pôs fim ao Estado Novo. Os pracinhas e seus comandantes não tiveram nada a ver com a história.

Milhares de brasileiros embarcaram para a Itália, lutaram dia e noite em solo estranho com temperaturas de até 20 graus abaixo de zero, enfrentaram os ultra bem preparados militares alemães. Ao voltarem, tiveram sua bagagem saqueada, medalhas e comendas prometidas que jamais foram entregues e depois de um desfile pelo centro do Rio de Janeiro foram perseguidos implacavelmente por Vargas.

Com o passar do tempo, muitos pracinhas foram parar no fundo do poço. Barone conta que a sede da associação dos ex-combatentes da FEB, na rua das Marrecas, no Rio, só sobreviveu graças a parentes e amigos dos combatentes.

Só que ontem, alertado pelo amigo Caíque Fellows no Facebook, li na coluna do Ancelmo Góis, no Globo, a notícia de que o governo do Estado, que havia cedido o imóvel na rua das Marrecas para a Casa da FEB, vai vende-lo para fazer caixa. Os helicópteros a serviço do governador continuam voando. As mordomias, OK. Tudo certo. Tudo em volta está deserto, tudo certo, governador.

Desertar é preciso. O Brasil de Vargas e Pezões não merece seus heróis.


A ditadura do falso moralismo quer brochar o planeta, enfiando uma burca na essência da mulher

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                                         Tempestade de testosterona                                                                                                          Um programa de TV de grande audiência mostrou, no início da semana, várias mulheres (algumas muito interessantes) e uns caras se dizendo horrorizados com as cantadas, piadas e “olhares mal intencionados” que “oportunistas” disparam contra as “mulheres de bem” que perambulam pelas ruas. O que está entre aspas foi dito pelos participantes do tal debate.

Para provarem o tal “crime”, copiaram o que eu já tinha assistido num canal de TV norte-americano. Instalam uma câmera nas costas de uma mulher de shortinho jeans gostosíssima e as imagens “flagravam” os “meliantes” soltando piadas, comentários, assovios. Na sequência, cortaram para o estúdio onde os debatedores só faltaram pedir pena de morte para os supostos pervertidos e suas “ofensas” contra as mulheres.

Não estou entendendo nada. Nada. A mulher procura uma alimentação equilibrada, faz ginástica, vai ao cabeleireiro, se maquia, se depila, adora roupas sensuais (viva!), na medida do possível lê bons livros eróticos, quem sabe um filme mais ousado de vez em quando, em muitos casos busca terapias para se relacionar melhor com a sua liberdade interior, está cada vez mais culta e bem informada, enfim, tudo bem? Não.

Depois da revolução social do pós II Guerra que culminou com o início da libertação da mulher nos anos 1960, que acabou se consagrando nos anos 1980, mergulhamos no século 21 sob o signo do atraso. E mais uma vez a mulher paga a conta.

Esse papo na TV que mostrei lá em cima é uma amostra de que realmente vivemos tempos que clamam mulheres vestindo pijamas de flanela brancos de bolinhas pretas, calções brochantes, sutiãs coador de café e a criminalização radical dos prazeres “ocultos”, logo nefastos, bem como fantasias “imersas em devassidão” da mulher, eterna condenada a ser “profissional do lar”, mãe, esposa, rainha do papai-mamãe e das novelas boçais.

Estou convencido desde a adolescência de que essa mulher carola, submissa, espetada nas cruzadas dos regulamentos moralóides não existe porque, queiram ou não os machistas mais primitivos, as fantasias da mulher estarão sempre a dois milhões de anos luz a frente das dos homens. Não foram poucas as mulheres que me concederam o privilégio de falar sobre repressão, ação, reação, liberdade, libertinagem (viva!), etc. etc. etc. E muitas me disseram que gostam de ser admiradas na rua, na livraria, no mercado, na praia, na padaria, no avião, na vida. Logo, esse moralismo na porta do terceiro milênio, com um jeitão de Idade Média (ou seria Idade Mídia?) não encontra espaço na mulher que conseguiu romper com o machismo, com o atraso, com conceitos que fedem a naftalina enquanto apodrecem nos armários de vime dos conceitos e preconceitos.

Aí embaixo, um texto esse texto meu que achei há tempos no Google. Foi publicado e depois guardado em alguma gaveta entre o ano 2000 e 2009, no extinto jornal Lig. Para quem não sabe, um HD de meu computador (novo, na garantia) pegou fogo dois anos e pouco atrás. Perdi mais de dois mil textos, cerca de 15 mil músicas e vídeos, outros milhares de endereços que estavam no Outlook Express, três livros inéditos e mais, muito mais. Não, eu não fazia e ainda não faço backup porque, provavelmente, de vez em quando sou uma zebra. Por isso, ando catando meus textos por aí. Esse é um deles. Vamos lá:

A quarta invenção mais sensual da civilização é a calça jeans feminina. Claro que a curiosidade vai berrar “e a outras três, meu chapa?”. Vamos lá. Terceira, o micro-biquini de lacinho; segunda a micro-calcinha de cotton; primeira o cipozinho com botão de folha de parreira, que você só encontra nos deliciosos e obscuros covis da Bahia, Jamaica, Los Angeles, Paris e, com certeza absoluta, em Londres.

Sei que é incorreto, mas quando cruzo com uma mulher gostosa na rua, paro, viro o pescoço e olho fixo. Meu inconsciente deve tramar algum macete pois nunca fui flagrado por uma delas. Nunca. Lembrando que mulher gostosa não tem cor, altura, idade, peso, nada. Mulher gostosa é como música boa. Bate e fica. Não tem explicação. Por timidez e respeito jamais emiti qualquer som. Ainda assim, para evitar um desatino perante uma cavala bem assombrada, boto a mão na boca.

Ah, Drummond. Ah, grande Carlos Drummond de Andrade que em vez de assobiar “fiu fiu” escreveu o belo poema “A bunda, que engraçada” que lá pelas tantas se desmancha: “(...) A bunda basta-se/ Existe algo mais?/ Talvez os seios/ Ora - murmura a bunda - esses garotos/ ainda lhes falta muito que estudar/ A bunda são duas luas gêmeas em rotundo meneio/ Anda por si na cadência mimosa, no milagre de ser duas em uma, plenamente(...)”

Falo com a certeza de que jamais em tempo algum molestei, cantei, encoxei em ônibus/barca/metrô/avião, enfim, só contemplei o que (não nego) é o maior patrimônio da Natureza, razão de viver, centro do Universo: a mulher. Olhar, sorver, contemplar sem atacar é um direito. Por isso, olho. Dos 18 aos 100 anos, mulher gostosa é mulher gostosa. Luis Buñuel não acreditava em “mulher sem bunda”. Muito menos eu, mestre. Existem belas bundas retas, retinhas. 
Catherine Deneuve, que mesmo arfando, suando, passando mal mesmo, consegui entrevistar nos anos 90, é proprietária de uma. Belíssima.

Meu único acidente de trânsito foi uma varada na traseira de um caminhão que freou numa rua aqui da cidade. Uma diva negra saía de uma galeria como as lavas do Vesúvio inundando Pompéia. Zonzo, bati. Zonzo, confessei minha culpa. Zonzo, parti sem telefonar para o seguro, porque as companhias de seguro não toleram a luxúria.

Certa vez escrevi que o brasileiro, elegantemente, cede a frente as damas em entradas de elevador, escadas de ônibus, portas de restaurantes não por educação, mas pela oportunidade de contemplar o dorso por trêssegundos. Já filosofava a extinta Rádio Relógio que o segundo é um milagre que não se repete e esses três segundos podem gerar euforia por horas.

A calça jeans tem o poder de mapear em detalhes todos os ângulos, sulcos, riachos e deltas de uma mulher. Por isso, jamais sai de moda. E que assim seja. Tenho um amigo que quando se aporrinha corre para um shopping e fica “bebendo” manequins de vitrine ostentando jeans, calcinhas, biquínis, shorts. Amigo do peito, sabem quem é a figuraça que já foi xingado de incorreto, porco-chauvinista e tarado pelos intelectuais. Pobres intelectuais.

O Dire Straits tem uma canção antiga chamada “Skateaway” que narra a tempestade de testosterona que uma mulher provoca patinando por dentro do trânsito congestionado no centro de Londres. “Aleluia, yes she comes..” canta Mark Knopfler, confessando que também é sócio desse clube que celebra a 
Mulher e concorda que de nada valeria um planeta cheio de baleias, golfinhos e sabiás se, à bordo, não estivesse essa indecifrável estrela que, com elegância e quase doçura, nos coloca na condição de plutões periféricos, girando, girando, girando, até a última palavra, do último texto, do último poeta.                    
                                                 

Mark Knopfler: o Cinema deve muito a ele e sabe disso

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Estou ouvindo Tracker, décimo nono álbum de Mark Knopfler (lançado há 15 dias, escocês de 65 anos, criador do Dire Straits, que tem como diferencial um traço raro. Ele nunca fez um trabalho razoável. São todos, absolutamente todos, excelentes. Com ou sem o Dire Straits.

Apaixonado pelo Cinema, é dele trilha sonora de um filme magistral e muito simples chamado “Local Hero”, com Burt Lancaster, que lamentavelmente passou batido pelos cinemas brasileiros. Motivo: o filme foi (des) qualificado como anticomercial.

Mas se você é sócio de um bom canal de streaming (Netxflix, Apple TV, etc) ou de uma ótima de DVD com certeza vai achar “Local Hero”, que no Brasil chamou-se “Momento Inesquecível”. Significa que se você chegar a locadora e pedir “Local Hero”, vão digitar no computador e responder “não tem”. Ou seja, você vai ter que pedir “Momento Inesquecível”, da mesma forma que Blow Up de Antonionni foi lançado no Brasil como “Depois Daquele Beijo”. Só rindo.

“Local Hero” foi a primeira trilha sonora de Knopfler, lançada no Brasil em 1983 pela Rádio Fluminense FM, graças ao saudoso Carlos Celles que nos deu uma fita em primeiríssima mão. Ele era diretor internacional da gravadora Polygram.

A gravadora me convidou com um pequeno grupo de jornalistas para assistir “Local Hero” numa sessão privada. Fui porque queria ver onde aquela trilha sonora mágica, lírica, um pouco lúdica de Knopfler foi inserida. Quase chorei no meio do filme tamanha a simplicidade, pureza, poesia que o diretor Bill Forsyth conseguiu passar para a tela.

A música, grandiosa música de Knopfler em seus momentos mais astrais (ele consegue fazer um clima totalmente astral em vários momentos da trilha) me deslocou para dentro da tela, para lugares na Escócia absolutamente mágicos como Pennan, Aberdeenshire, praia de Camusdarach e eu fui mergulhando, mergulhando, mergulhando, desejando estar lá, viver lá, contemplar aquelas aldeias remotas com suas auroras boreais que o bilionário Felix Happer, magistralmente interpretado por Burt Lancaster, venera, ama.

Lembro que, conversando com Celles, disse que eu já sentia nas canções de Mark a bordo do Straits um forte componente visual. “Skateway”, por exemplo, é uma amostra disso e não foi à toa que está no álbum “Making Movies” (“Fazendo Filmes”), sensacional, absolutamente sensacional como tudo que o Dire Straits gravou.

Em 2001 assisti com meu amigo Siri Mark Knopfler ao vivo no antigo Metropolitan, na Barra. Ele estava lançando o sensacional álbum “Sailing to Philadelphia” e o local estava super lotado. Eu fiquei exatamente na primeira fila, a poucos metros do palco, bem na frente dele e, com certeza, não vou esquecer de cada segundo daquele show, que foi, sim, frio, distante. Em determinado momento fui lá na house mix (mesa de som) e pedi ao cara para subir o som da guitarra, que estava baixo demais. O cara, provavelmente inglês, olhou para mim com aquela cara de fastio e permaneceu de braços cruzados.

Antes do show acabar, um colega meu, jornalista, chegou e me disse que M.K. estava querendo saber “quem é o jornalista que fez vários especiais sobre o Straits na TV e no rádio e, ainda por cima, escreveu uma matéria de capa sobre mim num importante jornal (era o Jornal do Brasil)”. Perguntei ao colega, “o que isso significa?” e ele “meu chapa, significa que, depois do show, se você quiser ir conhecer o cara no camarim não haverá problema”. Não fui. Temor reverencial.

Lembrei do Who que, apesar de praticamente estar com o ingresso na mão para ver a “minha” banda em Nova Iorque, amarelei. Vai que naquele dia a banda ia tocar mal, que Pete Townshend daria uma engrossada. Foi quando, acho que na revista Bizz, escrevi que “lugar de ídolo é no Olimpo”. E foi assim que não quis conhecer Mark Knopfler pessoalmente nem muitos outros que, de fato, vivem no Olimpo.

O álbum Tracker me pegou pelo pescoço. Banhado de blues, folk e slides guitars (universo tipicamente knopflerniano) o disco não economiza genialidade. É leve, eventualmente dá uma pesada (sempre pelo flanco folk), depois volta. Enfim, em se tratando de música, Mark Knopfler consegue fazer o que quer, o que é muito difícil num planeta afogado em tecnologia de ponta e mediocridade de quinta.

O Cinema deve um Oscar de melhor trilha a Mark Knopfler. Se não for Oscar, que seja algo similar. Afinal já foram seis trilhas sonoras magistrais, compostas para os mais variados filmes; ingleses, irlandeses, escoceses. O Cinema deve um prêmio e sabe disso.

A TV me ejetou e isso foi ótimo

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Eu já não assistia muito televisão, mas com o crescente processo de imbecilização da mídia, cada vez perdia menos tempo em frente aquele moedor de carne e alma, vulgo telinha. Não o conheço, mas sequer posso ouvir a voz de Faustão, ou de Luciano Huck, que também nunca vi pessoalmente. Altas Horas ainda usa o slogan “vida inteligente na madrugada” (?????) e o Esquenta, nunca assisti.
Como a baranganização também começou a migrar para os canais por assinatura, mas sempre há honrosas exceções: Globonews, Canal Brasil, Curta, Arte 1, Bis, History, etc. Na internet muitos grandes portais abriram as pernas para a vulgaridade, acompanhando a onda da TV. Outros viraram usina de fofocas de supostas celebridades extraídas de novelas ou então de programas que nunca vi como um tal de “A Fazenda”. Só que, felizmente, a internet dá outras zaralhadas de opções e não ficamos reféns de coisa alguma.

Banido da TV pela própria TV, onde só assisto bons noticiários (destaque para o Jornal da Band e o Jornal da Globo) e alguns programas de qualidade como “Tá no ar, a TV na TV”, eu praticamente só assistia a filmes que me interessam e a novela das 9. Sou noveleiro desde “Pantanal”, na extinta TV Manchete, e não me envergonho por isso. Só que novela escraviza e eu quero mais é ir pra rua, ver a lua, conversar com meus amigos, etc. etc. etc.

Por isso, dentro desse meu decretinho pessoal, degolei as novelas. Meu lazer é a rua e quando venho para a internet navego no Facebook, o infinito You Tube, escrevo esta Coluna, enfim, adeus televisão.

Nos anos 1980 os Titãs gravaram uma música cujo refrão cai como vulva: “A televisão me deixou burro, muito burro demais”, que é a trilha de abertura do “Tá no Ar...”, programa do cacete, por sinal. Pura verdade. E como cantou Gilberto Gil “já que existe lua/ vai-se para a rua ver”. É o que vou fazer, sem mágoas, sem ressentimentos, apenas com aquela agradável sensação de existência sendo cumprida.
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