- Em seu depoimento o senhor diz que o motorista jogou a Kombi em cima dos pedestres de propósito e o veículo acabou atingindo o seu ombro.
- Sim.
- Em seu depoimento o senhor diz que deu uma cotovelada no vidro da frente da Kombi; em seguida arrancou o motorista pela porta e começou a surrá-lo impiedosamente no meio da rua.
- Não. Dei um soco no vidro e uma cotovelada no motorista. Ele pegou uma barra de ferro e saiu do carro. Foi quando o surrei.
- Até a morte.
- Sim.
- Também bateu nos dois guardas que tentaram te conter.
- Sim.
- Eles estão hospitalizados.
- Sim.
- Testemunhas confirmam que o motorista jogou a Kombi contra o senhor de propósito. Sabe por que?
- Não.
- Sabe o que vai acontecer com o senhor, né?
- Sim. Não vai acontecer nada.
- O senhor será preso, julgado, condenado…
- Vou ficar no máximo cinco horas na cadeia aqui da sua delegacia e depois responderei em liberdade. Serei absolvido.
- O que te garante tanta certeza assim?
- Sou rico. Ricos fabricam justiça. Sou inocente. Sou réu primário e tenho curso superior.
- Estudou o que?
- Comprei o diploma de economista em uma faculdade da capital.
– O senhor é frio e arrogante.
- E o senhor parece não gostar dessa cidade.
- Como assim?
- Se continuar importunando vou mandar transferi-lo para o último distrito no norte do estado. O senhor acha que manda, já eu alugo quem manda no senhor.
- …levem esse cidadão para a sala especial. Ele ficará detido lá nas próximas horas…nada de celas, sala especial.
- ...até meus advogados acionarem quem manda.
- Só peço...só peço que o senhor saia pela porta dos fundos da delegacia...não quero ficar tão desmoralizado...e quanto...quanto a transferência, por favor esqueça. Esqueça.
E tudo foi esquecido.