A avenida Brasil parece íntima, mas não é. Nos anos 1970, 80, 90, 2000, subi e desci suas pistas literalmente milhares de vezes. Em busca de notícias, de mulheres que me incendiaram, casa de amigos. Conheço cada pista, cada palmo, cada faixa, mureta da avenida Brasil, mas ainda a estranho. Por que? Porque ela sempre me estranhou e vai me estranhar sempre.
A avenida Brasil é existencialista, despreza o amanhã, ignora o ontem. Ali o que vale é o agora, o bangue bangue emcional, o caos que eventualmente se torna Cosmos. Ou não. É pegar ou largar. Quem desiste não volta, quem insiste demais bate de frente.
Se eu fosse Bruce Springsteen teria composto Nebraska, sua obra prima, em algum ponto daquela torta avenida e seu asfalto roto que liga tristeza a esperança, o sorriso ao nó na garganta, o nada ao lugar nenhum, nervos nublados a euforia existencial. Façam os jogos, senhores. A avenida Brasil é o pano verde de cada dia, onde milhares de pessoas jogam todas as suas fichas, dia sim o outro também.
Nebraska, canção que abre o álbum, fala de um degenerado executado na cadeira elétrica. A avenida Brasil também olha, prende, julga, condena e mata. E não é preciso ser o degenerado descrito por Springsteen e muito menos o assassino do árabe de “O Estrangeiro”, de Albert Camus. Basta ser gente. Gente que vai e não volta. Gente que volta e não vai. Os sulcos da avenida, volta e meia salpicados de sangue, jogam na vala. Vala comum. Vala incomum.
Avenida Brasil, Nebraska nosso de cada dia. Sem gaita, sem voz, sem violão. Apenas um som. Ermo, brusco, surdo, como os baques, os beijos, o soco, a bruma, a fumaça. Nebraska, sim.
Sempre.
Nebraska
(Bruce Springsteen)
I saw her standin' on her front lawn just twirlin' her baton
Me and her went for a ride sir and ten innocent people died
From the town of Lincoln Nebraska with a sawed-off .410 on my lap
Through to the badlands of Wyoming I killed everything in my path
I can't say that I'm sorry for the things that we done
At least for a little while sir me and her we had us some fun
The jury brought in a guilty verdict and the judge he sentenced me to death
Midnight in a prison storeroom with leather straps across my chest
Sheriff when the man pulls that switch sir and snaps my poor neck back
You make sure my pretty baby is sittin' right there on my lap
They declared me unfit to live said into that great void my soul'd
Be hurled
They wanted to know why I did what I did
Well sir I guess there's just a meanness in this world